“Mas só digo o que penso. Só faço o que gosto e aquilo que creio.” Este é um trecho de “Resposta”, canção composta por Maysa em 1956. Como uma mulher muito à frente de seu tempo, suas letras são atemporais.
Para mostrar que a “música não envelhece, muito menos morre”, como ele mesmo acredita, o músico, produtor, DJ e cantor George Mendez, a.k.a. Vizcaya, anuncia o EP “Convite para remixar Maysa”, concebido para celebrar o legado de uma das vozes mais importantes da música popular brasileira que atravessa o tempo.
O lançamento do projeto não poderia ter ocorrido em outra data se não no aniversário de Maysa – 6 de junho, a qual completaria 85 anos se estivesse viva -, e conta com versões de seis clássicos de mais de 60 anos de seus primeiros três discos: “Bom Dia Tristeza” (1958), “Ouça” (1957), “Tarde Triste” (1956), “Franqueza” (1957), “Resposta” (1956) e seu maior sucesso “Meu Mundo Caiu” (1958).
“Convite para remixar Maysa”
Como na época não existia acapela, as músicas eram gravadas inteiras em mono, ao vivo, sem cortes, com cantor e orquestra em uma única pista no estúdio.
Vizcaya precisou utilizar softwares de inteligência artificial para filtrar e separar os instrumentos e vozes com qualidade. Transportando Maysa para um ambiente de sintetizadores, os beats atravessam a música eletrônica e vão do Tropical House e Trip-Hop ao Tech-House.
“O processo em si de reconstruir um novo instrumental para cada faixa foi rápido, porque eu conhecia bem todas as músicas dela, eu as escuto desde que me entendo por gente. As notas e acordes são complicados, mas poli e reduzi os arranjos a algo mais objetivo, embora todos sigam a melodia original. A partitura segue a mesma para o meu remix feito em 2020 e para a original de 1957. O trabalho maior foi ‘filtrar’ a voz da Maysa. Tentei com os softwares existentes no mercado, mas todos trabalham com algoritmos e generalizam o processo, aplicando, digamos, ‘um mesmo template de filtro’ para todos os tipos de músicas. E no meu caso eles não serviram 100% para Maysa. Logo, tive que aplicar recursos técnicos de anulação de fase quase que palavra a palavra da voz dela. Foi na mão, na raça e na paciência mesmo”, revela.
Para Vizcaya, fã de Maysa – que já leu as duas biografias oficiais, assistiu a minissérie produzida pelo filho da cantora, Jayme Monjardim, umas quatro vezes, e herdou os vinis originais da família -, a cantora é a maior diva brasileira de todos os tempos.
“Autora, uma voz de timbre único e uma pessoa de temperamento e personalidade muito fortes. Sem medo, sem papas na língua, que jogou um casamento milionário e um quase título de nobreza na sociedade paulistana para cima, para viver seu sonho da música, viver seu ofício de cantora e intérprete”, descreve.
“Maysa escrevia suas músicas com a alma sangrando e interpretava com o coração na mão banhado em álcool. Foi a primeira brasileira a se apresentar na TV japonesa ao vivo em 1959 e foi aplaudida de pé em Paris, cantando na língua local, um dos seus maiores clássicos ‘Ne Me Quitte Pas, elogiada pelo próprio autor da música, Jaques Brel”, completa.
O amor pelos “dois oceanos não pacíficos” de Maysa o fez trabalhar fielmente nas músicas, com arranjos originais, letras na íntegra e obediência às partituras, mas imprimindo sua marca pessoal na sonoridade. Vizcaya espera que com esse EP as novas gerações possam revisitar a obra da cantora e reconhecer sua importância para a música brasileira, pois “se a alguém interessa saber… sou bem feliz assim. Muito mais do que quem já falou ou vai falar de mim”.